terça-feira, 11 de abril de 2017

Mitologia engarrafada em Portugal

Fazia algum tempo que a gente não revia nossos queridos amigos Sílvia e Nuno – e por razões muito boas : primeiro, Tereza e eu estávamos viajando por 20 dias pelo Marrocos. Logo em seguida, eles partiram para uma viagem de 30 dias por Portugal, onde o Nuno pôde rever sua terra natal, da qual estava afastado há um bom tempo.

Domingo último, matamos as saudades – e eram tantas histórias para contar, de um lado e de outro,  que ficamos juntos por quase 8 horas (!!!), falando sem parar …

Isto é – sem parar, não. Paramos algumas vezes, para comer e principalmente para beber algumas das coisas maravilhosas que eles trouxeram de sua viagem.

Provamos vinhos deliciosos, do Douro e do Alentejo, mas o grande destaque do dia – e causa deste post solene – foi a garrafinha da foto aí abaixo :


Sim, entre tantas coisas boas para falar, para ouvir, para comer e para beber, despontou nada mais, nada menos do que um mitológico Pêra Manca Branco 2014

Pra quem não está ligando o nome à pessoa, o Pêra Manca é o belíssimo vinho produzido na igualmente belíssima cidade de Évora, no coração do Alentejo, pela Adega Cartuxa (Fundação Eugênio Almeida). Ah, ele é também, ao lado do Barca Velha, um dos dois mais famosos, respeitados e reverenciados vinhos de Portugal.

A história da Adega Cartuxa é interessante – seu fundador, Vasco Maria Eugênio de Almeida, era um dos homens mais ricos de Portugal. Ao morrer, em 1963, e como não tinha herdeiros, ele deixou sua fortuna para a Fundação Eugênio Almeida – que, desde então, reverte todos os seus lucros em inovações tecnológicas e – o que é mais bacana – em ações sociais junto à comunidade em que está inserida.

O Pêra Manca Branco é produzido com as uvas antão vaz e arinto, carregando toda a tipicidade do Alentejo. Aroma frutado, cítrico e mineral – daqueles aromas que têm “camadas” : à medida em que o tempo vai passando, você vai descobrindo na taça novas nuances.

Na boca, um vinho seco, mas macio, com ótima acidez, e com sabor complexo e muito persistente.

Harmonizou maravilhosamente com um queijinho camembert – a acidez do vinho combinada à untuosidade do queijo resultava em uma coisa nova, um terceiro e delicioso sabor, que lembrava nozes ou amêndoas. Inesquecível !


Fica registrada aqui, portanto, nossa imensa gratidão à Sílvia e ao Nuno por nos proporcionarem a graça de saborear essa maravilha !

quinta-feira, 6 de abril de 2017

A uva dos castelos dos contos de fada

Castelo de Chambord
No oeste da França fica a bela região cortada pelo rio Loire. Ao longo do seu vale – e ao longo dos séculos – foram sendo erguidos na área alguns dos mais famosos e mais lindos castelos do mundo. Entre os séculos X e XVI, a nobreza francesa construiu por aqui os castelos de Amboise, Chambord, Chennonceau … Pra repetir o chavão de sempre, parecem todos saídos dos contos de fadas que a gente lia na infância.

Castelo de Chennonceau

Pois é nessa terra encantada que reina uma uva muito especial – a chenin blanc. Segundo os estudiosos do assunto, a chenin blanc parece ter surgido em algum ponto do território francês por volta do século IX. No Vale do Loire ela encontrou, nos solos de argila e calcário da região,  à sombra dos belíssimos castelos, o terroir perfeito para desenvolver sua marcante acidez e sua complexidade.

O escritor francês François Rabelais, lá pelo início do século XVI, já mencionava a chenin como integrante dos banquetes e festivais dos camponeses de Anjou – uma sub-região do Loire.

Essa nossa uvinha é também muito versátil (a manjada expert Jancis Robinson afirmou certa vez que a chenin é provavelmente a uva mais versátil do mundo) : os franceses elaboram com ela vinhos varietais secos, mas também vinhos de sobremesa, vinhos fortificados e até um bom espumante, o Crémant de Loire. Ela também entra em alguns blends com outras uvas brancas, como sauvignon blanc ou chardonnay, contribuindo com sua característica acidez.

Partindo do Loire, a chenin blanc espalhou-se pelo chamado Novo Mundo. Nova Zelândia, Estados Unidos, Austrália e – principalmente – a África do Sul produzem hoje ótimos vinhos dessa cepa. A propósito, na África do Sul ela é hoje a uva mais plantada, ocupando cerca de 18 % dos vinhedos.
Os vinhos do Loire tendem a apresentar aromas de minerais e toques de mel, com a acidez da fruta se destacando. Já os do Novo Mundo costumam exibir aromas mais, digamos, tropicais : são aromas de frutas como goiaba e banana, abacaxi e pera.

Tenho bebido bastante, nos últimos tempos, um ótimo chenin blanc sul-africano, chamado Neethlingshof . OK, OK, o nome é difícil de pronunciar, mas acreditem – o vinho é muito bom !

Quando possível, beberiquem um vinho de chenin blanc – e sonhem com os encantadores castelos das fotinhos aí do alto …




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